A Justiça condenou o prefeito de Ilha Solteira (SP), Otávio Gomes (PSDB), por ter sido “funcionário fantasma“ na Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp).
Ontem (24), a juíza Ana Luiza Villa Nova, da 16ª Vara da Fazenda Pública, julgou procedente ação de ressarcimento ao erário proposta pelo Ministério Público.
Otávio Gomes foi condenado ao pagamento de R$ 36.083,50 com correção monetária e juros.
De acordo com a ação, de 6 de fevereiro a 3 de maio de 2007, Otávio ocupou o cargo de assessor parlamentar na Alesp e, no mesmo período, estava matriculado e frequentou o curso de engenharia civil, em tempo integral, na Unesp de Ilha Solteira.
Na sentença, a juíza menciona a “impossibilidade de regular exercício de ambas atividades”. Além disso, traz a sentença que “não há prova documental dos trabalhos que disse que executou no referido período”.
“Está demonstrado também que a carga horária exigida era de 40 horas semanais, o que corrobora a inviabilidade de cumprir tal carga e ao mesmo tempo cursar em tempo integral a faculdade de engenharia”.
Para a juíza, ainda que Otávio tente justificar a ausência de prova documental pelo tempo decorrido, “é ônus seu comprovar suas alegações”.
Ainda conforme a sentença, Otávio não pode alegar ausência de dolo ou culpa, “pois o réu sabia e deveria saber acerca da sua conduta ilegal e que consistiu em receber pagamento sem ter prestado o serviço público correspondente, o que configura enriquecimento indevido, sem causa, às custas do erário público”.
O réu sabia e deveria saber acerca da sua conduta ilegal e que consistiu em receber pagamento sem ter prestado o serviço público correspondente, o que configura enriquecimento indevido, sem causa, às custas do erário público
Ana Luiza Villa Nova, juíza da 16ª Vara da Fazenda Pública
A ação
O Ministério Público propôs ação contra Otávio Gomes sob a acusação de ter sido ‘funcionário fantasma’ da Alesp, em 2007.
De acordo com o promotor Marcelo Camargo Milani, um inquérito civil instaurado para apurar as eventuais irregularidades revelou que Otávio teria sido “funcionário fantasma” da Alesp.
Otávio foi nomeado para o cargo em comissão de assessor especial parlamentar no período de 6 de fevereiro a 3 de maio de 2007.
O referido cargo estabelecia 40 horas semanais de trabalho na Alesp, que informou ao MP que o cargo “não gozava de regime especial de trabalho”, ou seja, Otávio deveria exercer suas funções nas dependências da Alesp.
Além disso, o sistema informatizado da Alesp registrou como “frequência integral” durante todo o período em que Otávio esteve nomeado como assessor.
Entretanto, com base nas provas colhidas no inquérito, o promotor denunciou que Otávio “jamais prestou as funções inerentes ao cargo ocupado ou quaisquer outras funções públicas”.
Isso porque, no mesmo período, estava matriculado na Unesp de Ilha Solteira para cursar engenharia civil em tempo integral.
O promotor destacou a carga horária e a frequência de Otávio no curso e constatou que o prefeito em exercício recebeu salário sem trabalhar na Alesp.
De fevereiro a maio de 2007, foram recebidos R$ 36.083,50 em salários como assessor. Valor que o MP pede ressarcimento.
Para o promotor, houve enriquecimento ilícito e prejuízo aos cofres públicos. Além disso, Milani considerou o fato de Otávio receber sem trabalhar como “ato de improbidade administrativa grave”.
O representante do Ministério Público disse que o ato ofende “de forma escancarada” os princípios que regem a Administração Pública, em especial o dever de honestidade e observância à legalidade.
O inquérito civil foi instaurado em junho do ano passado, após denúncia anônima.
A defesa
Em sua defesa, Otávio alegou que o cargo de assessor especial parlamentar foi criado em 1995 e que não estabeleceu rol de atribuições.
Segundo a defesa do prefeito, somente em 2016 as atribuições do cargo foram fixadas pela Alesp, que implantou nova estrutura administrativa.
Ainda em sua defesa, Otávio afirmou que quando assumiu o cargo em comissão, que exige confiança do agente político, ficou acordado que a assessoria se daria na representação parlamentar perante autoridades, atos, reuniões, audiências públicas, dentre outros.
Além de atendimento a representantes da sociedade civil. Também elaborava ofícios, atas, relatórios e realizava pesquisas legislativas e de matérias jornalísticas relacionadas à atividade parlamentar.
De acordo com a defesa, as atribuições que exerceu não se limitavam aos serviços prestados na sede da Alesp, sendo que a maior parte ocorria na região onde a base eleitoreira do deputado se concentra.
Afirmou também que, em razão da aprovação no curso de engenharia e por não mais conseguir conciliar a “pesada rotina de trabalho” e assessoramento com o curso em período integral, optou pela graduação e rompeu o vínculo com a Alesp em 3 de maio de 2007.
Funcionário fantasma
Se chama popularmente “funcionário fantasma” o servidor público que ganha e não aparece para trabalhar e que, via de regra, são protegidos por pessoas de dentro da estrutura administrativa.
Pessoas essas com capacidade e poder para manter recebimento de salário sem qualquer tipo de prestação de serviço, definiu o promotor do caso.
Otávio foi nomeado assessor especial parlamentar na Liderança do PP, partido no qual, o pai, Edson Gomes, exerceu dois mandatos como deputado estadual, entre 1999 e 2007.
O outro lado
A reportagem do ilhasolteira.news entrou em contato com a advogada de Otávio Gomes nesse processo, Priscilla Ronqui, que confirmou que vai recorrer da decisão de 1ª instância ao Tribunal de Justiça.
A advogada adiantou que a juíza trouxe para Otávio o ônus da prova, que deveria ser do Ministério Público, autor da ação.
Além disso, a juíza recusou prova documental e desconsiderou o fato de que à época não existia regulamentação das atividades.